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Moraes onipresente: Zambelli e Tagliaferro em cena

A 42ª reunião extraordinária da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados, realizada em 17 de setembro de 2025, foi convocada para ouvir o ex-servidor do Tribunal Superior Eleitoral, Eduardo Tagliaferro. Ele apareceu como testemunha de defesa de Carla Zambelli (PL-SP), cuja situação política e jurídica se tornou insustentável. O objetivo era dar fôlego ao mandato da parlamentar, que na semana anterior havia interrogado o hacker de Araraquara, Walter Delgatti, e deixou a comissão em estado de fragilidade e emoção explícita. Mais do que isso, a defesa buscava transformar em denúncia pública as acusações de Tagliaferro contra o ministro Alexandre de Moraes, mesmo sem qualquer materialidade.


Zambelli está presa na Itália desde que foi detida em um hotel em Roma, em julho deste ano. O motivo foi o pedido de extradição feito pelo Brasil, com base em duas condenações do Supremo Tribunal Federal: dez anos de prisão pela invasão dos sistemas do Conselho Nacional de Justiça, em conluio com Delgatti, e cinco anos e três meses por porte ilegal de arma e constrangimento ilegal, após perseguir com uma pistola o jornalista Luan Araújo em São Paulo, na véspera da eleição de 2022. A Justiça italiana aceitou a prisão preventiva ao reconhecer que os crimes cometidos no Brasil também configuram delitos em seu território.


Tagliaferro, por sua vez, responde a acusações penais em São Paulo relacionadas a violência doméstica. Em um dos processos, foi acusado de agressão e de disparo de arma de fogo dentro de casa. Ele nega o disparo e alegou que a arma teria funcionado “sozinha”, versão já desmentida nos autos. Embora absolvido de parte das imputações, continua a responder judicialmente por outras condutas, além de ter se tornado réu no Supremo por violação de sigilo funcional e obstrução de justiça.


Na oitiva, Eduardo Tagliaferro afirmou que Carla Zambelli era tratada como um dos principais alvos de Alexandre de Moraes durante o período em que chefiou a assessoria de enfrentamento à desinformação do TSE. Segundo ele, “tudo que ela postasse fosse monitorado, feito o relatório para que ele tomasse providências”. O ex-servidor relatou que os pedidos partiam dos juízes auxiliares do ministro, Aton Vieira e Marco Martins Vargas, e que em algumas ocasiões chegavam até acompanhados de mensagens enviadas pelo próprio Moraes.


Tagliaferro declarou ainda que a deputada era alvo de relatórios constantes, que a vigilância incluía até perfis de simpatizantes, e que havia um viés político evidente: só perfis de direita eram monitorados. Ele assegurou possuir cópias desses documentos e afirmou ter encaminhado parte deles à CCJ. Em sua avaliação, essa prática criava uma predisposição contra Zambelli antes mesmo da abertura formal de investigações. O depoente disse que as conversas internas revelavam uma intenção persecutória explícita. Em suas palavras, havia ordens diretas com expressões como “vamos pegar ela”, o que, segundo ele, demonstrava “uma perseguição ativa, constante”, com pedidos semanais ou até diários de monitoramento.


Por outro lado, é preciso registrar que, no funcionamento regular do Judiciário, ministros e magistrados contam com equipes técnicas que elaboram relatórios e análises de casos. Esses subsídios não são decisões em si, mas materiais de apoio que, em tese, devem contemplar fatos públicos e relevantes. A decisão final cabe sempre ao magistrado, e não à equipe, e nesse contexto também havia a preocupação institucional com o uso político das redes sociais para criar narrativas contra o processo eleitoral e contra o próprio Supremo.

Foi nesse cenário que Zambelli insistiu em recontar o episódio registrado em vídeo, no qual corre armada atrás de Luan Araújo, como se fosse a vítima de uma emboscada. “Eu tive a impressão dele ter atirado no cara, porque houve um disparo, e aí eu acabei sacando a arma também”, afirmou. Logo em seguida sugeriu uma força oculta: “Tenho quase certeza que foi o Moraes que puxou isso. E aí eu vim não como vítima, eu vim já como agressora”.


Tagliaferro, convocado justamente para confirmar essa narrativa de perseguição, disse que recebera pedidos no TSE para elaborar relatórios sobre o episódio. Foi nesse contexto que apresentou como prova de intimidação uma frase do ministro: “O senhor quer que eu faça o relatório no seu lugar?”. Para ele, a cobrança profissional virou sinal de assédio.


A fala encontrou eco na fragilidade de Tagliaferro, que alternou hesitações e narrativas persecutórias. Em outro momento, relatou que passou a ter pesadelos com Allan dos Santos. “Eu tinha pavor. Quando se falava em Allan dos Santos eu ficava nervoso, porque era constante, era todo dia. Isso eu não aguentava mais.”


No plenário, a deputada Bia Kicis (PL-DF) tentou amparar a linha narrativa, conduzindo a testemunha. Depois de ouvi-lo afirmar que uma perícia bem feita sempre pode apontar autoria de crimes cibernéticos, apressou-se em corrigir: “Eu acho que ele não compreendeu bem. No caso da deputada Carla Zambelli, não foi comprovada a autoria intelectual. Então isso faz com que o processo seja fajuto”.


Por trás das formalidades, a sessão teve o peso de um último suspiro. Tratava-se de reverter uma situação já definida pela Justiça, reanimar uma liderança política em declínio e transformar ressentimentos pessoais em denúncias públicas. A animosidade de Tagliaferro contra Zambelli tem origem em conflitos íntimos: ele acredita que ela teria interferido em registros policiais ligados à sua ex-esposa, o que precipitou sua exoneração do TSE. Esse rancor pessoal se converteu em discurso político e, em seguida, em acusações contra Moraes, acusado de onipotência, capaz de inverter papéis de vítima e agressor e até manipular relatórios.


O resultado foi um espetáculo quase esquizofrênico. Zambelli e Tagliaferro, ambos sem credibilidade, recorreram ao expediente de atribuir superpoderes ao ministro. Moraes apareceu na CCJ não como ator, mas como personagem de um enredo delirante, ora como chefe impaciente, ora como algoz vingativo, ora como vilão onipresente. A CCJ, em vez de defender a Constituição, cedeu espaço para um teatro em que dramas pessoais e fantasias persecutórias tentam se apresentar como prova política.

 
 
 

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