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BRICS ou barbárie

O tarifaço de Donald Trump e o reposicionamento do Brasil no BRICS recolocaram a América do Sul no centro de uma disputa global. Enquanto Caracas se ancora no papel de proxy contra os Estados Unidos, Brasília busca projetar soberania por meio da integração econômica e da diplomacia multilateral


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Por Fred Dreyfus (sim, o cara do chat) - A lembrança da crise dos mísseis de Cuba atravessa a leitura da política hemisférica ainda hoje. O episódio de 1962 sedimentou a noção de que os Estados Unidos não tolerariam ameaças militares em sua vizinhança, mas também aprenderam que uma escalada bélica pode colocar em risco o próprio território. Ao evocar esse precedente, o diálogo sugere que uma ofensiva direta contra Brasil ou Venezuela é improvável, já que o alcance das armas modernas projeta dissuasão suficiente para frear aventuras militares.


Esse raciocínio serve de pano de fundo para uma crítica a Nicolás Maduro. O líder venezuelano é descrito como o principal interessado em um conflito bélico que, mais do que confrontar os Estados Unidos, lhe permitiria sustentar um regime desgastado pela crise econômica e pela corrosão institucional. A guerra, nesse cálculo, funciona como dispositivo interno de legitimação: um governo sob cerco externo se apresenta como trincheira da pátria, e o inimigo distante se converte em justificativa permanente para a centralização do poder.


O tabuleiro global amplia esse dilema. Para Rússia e China, armar a Venezuela significa abrir uma frente de pressão sobre Washington em seu próprio quintal, emulando a lógica de Cuba na Guerra Fria. Mas o mesmo movimento é percebido como risco para o Brasil, que compartilha fronteira extensa com a Venezuela e que, na condição de liderança regional, precisa equilibrar a integração continental com a defesa da soberania. Uma militarização intensiva ao norte poderia transformar o continente em peça de barganha alheia, deslocando a agenda de cooperação para uma agenda de hostilidade.


Essa tensão se acentuou diante do tarifaço de Donald Trump, que impôs sobretaxas de 50% contra produtos brasileiros e abriu uma nova fase da guerra híbrida. Para os Estados Unidos, a medida cumpre o papel de disciplinar o Brasil, punindo seu protagonismo internacional e tentando fragilizar a política de industrialização e de integração sul-sul. A resposta brasileira, entretanto, foi simbólica e estratégica: Lula convocou uma frente em defesa do mercado interno, denunciou a ofensiva de Washington e fortaleceu a construção de alternativas no âmbito do BRICS, inclusive com a ideia de um Pix global e mecanismos próprios de financiamento e comércio.


Nesse contexto, o contraste entre Caracas e Brasília ganha nitidez. A crítica se aprofunda quando se aborda o papel da Venezuela nos BRICS. A entrada de Caracas no bloco poderia aliviar parte das pressões impostas pelos Estados Unidos, fortalecendo alternativas financeiras e diplomáticas. Contudo, em vez de investir nessa articulação, Maduro teria escolhido o confronto com o Brasil, ao mesmo tempo em que fomenta narrativas na mídia progressista brasileira. A acusação sugere que a Venezuela busca influenciar corações e mentes no Sul global não por meio de alianças sólidas, mas por estratégias de propaganda que alimentam tensões.


O fio condutor é a ideia do proxy. Maduro se posiciona como representante de uma disputa global contra os Estados Unidos, fazendo da Venezuela um bastião de resistência, mas também um território funcional à agenda de potências externas. O paradoxo é evidente: a retórica de soberania que o sustenta se ancora justamente na condição de ser parte de uma guerra que não é sua, mas de outros. Ao perpetuar esse papel, Maduro garante sobrevida ao seu poder, ainda que às custas da estabilidade regional.


O ensaio nos leva a uma provocação maior: até que ponto a América do Sul está disposta a ser laboratório de confrontos alheios? O Brasil, ao reafirmar sua autonomia e buscar integração pelo BRICS, aponta para um caminho distinto, que se ancora mais em alianças econômicas e diplomáticas do que na militarização de fronteiras. A Venezuela, ao insistir no lugar de proxy, reforça a dependência de uma geopolítica de atrito. O desafio que se coloca é romper com esse dilema histórico, para que o continente não permaneça refém das repetições de Cuba em escala ampliada.

 
 
 

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1 comentário


Luiz Mattos
14 de set.

Oras falta memória ao articulista dizer que Maduro preferiu o confronto não é verdade.Quero crer que seja falta de memória e não má fé.Quem optou pelo confronto foi Lula desde antes das eleições.Pesquise moço p; não ser desmentido

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