Nem dentro, nem fora do governo. O lugar do PDT é no divã
- Sara Goes
- 8 de mai.
- 2 min de leitura
Em que momento o PDT foi coerente com o campo progressista desde o segundo turno de 2022? A verdade é que o partido encenou lealdade institucional enquanto cultivava, nos bastidores, ressentimentos e delírios de protagonismo

Há quem diga que o PDT deixou a base do governo Lula. Há também quem jure que o PDT nunca esteve na base. E há os que seguem dizendo que está, mas só de "maneira crítica", como se isso ainda fosse possível depois da carta de rompimento com carimbo de mágoa e assinatura coletiva da bancada. Diante de tantas versões simultâneas, é justo batizar o momento de “PDT de Schrödinger”: ao mesmo tempo governo e oposição, esquerda e direita, Brizola e... Ciro Gomes.
A decisão de deixar a base após a queda de Carlos Lupi do Ministério da Previdência foi apresentada como reação indignada à ausência de solidariedade do governo. Mas a pergunta real é: por que estavam na base até agora? Em que momento o PDT foi coerente com o campo progressista desde o segundo turno de 2022? A verdade é que o partido encenou lealdade institucional enquanto cultivava, nos bastidores, ressentimentos e delírios de protagonismo.
Não é de hoje que os ciristas vivem uma espécie de impasse psquiátrico. Ao mesmo tempo em que insistem em repetir que são "a verdadeira esquerda", não conseguem articular nenhum projeto coletivo que não gire em torno da figura ferida do próprio Ciro. O partido que deveria carregar o legado de Leonel Brizola virou um divã político: um espaço onde se elaboram frustrações, transferências e recalques mal resolvidos com o PT.
Ciro, aliás, já ultrapassou todas as fases do luto político — negação, raiva, barganha, depressão — e estacionou na mais patológica: a de querer reescrever os fatos. Como bom narcisista de manual, transforma qualquer crítica em traição e qualquer derrota em injustiça histórica. Só não admite, nem diante do espelho, que talvez tenha contribuído mais para o avanço do bolsonarismo do que gostaria de reconhecer.
Agora, com o rompimento formal, os ciristas têm a oportunidade de ouro para sair do armário — politicamente falando. Podem, enfim, assumir o papel de linha auxiliar do bolsonarismo sem as amarras do verniz progressista. Afinal, já vinham flertando com a retórica antipetista, os ressentimentos de classe média e a pose de paladino moral há bastante tempo. A diferença é que, agora, não precisam mais fingir.
O "PDT de Schrödinger" é a prova de que um partido pode existir em múltiplos estados políticos ao mesmo tempo — até que a realidade se imponha. E ela se impôs. Resta saber se, no colapso da superposição, sobrará alguma partícula brizolista ou se tudo será tragado pelo buraco negro do personalismo rancoroso.
Porque uma coisa é certa: o PDT já não é. E, se continuar assim, também não será.
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