Budejo nacional: como a mídia devora Lula, Janja e a institucionalidade
- prefirocuscuz
- 11 de dez. de 2024
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Budejo é aquele tipo de conversa que parece o passaporte do Inelegível: não vai para lugar nenhum. São resmungos, reclamações e opiniões soltas, quase sempre ditas num tom meio displicente, mas que revelam muito sobre o momento. Pois bem, passei boa parte da tarde de hoje ouvindo os mais variados tipos de budejos sobre o evento médico do presidente Lula: os da TV, da internet, das transmissões mistas, das correntes de WhatsApp e do X. Foi uma verdadeira cacofonia nacional, onde cada canto encontrava um motivo para comentar o caso do presidente, misturando opinião, drama e muito veneno.
O estado de saúde de um presidente é, sem dúvida, questão de interesse público. Mas o que estamos testemunhando transcende qualquer coisa que se aproxime de bom senso. Transformaram o caso de Lula em uma novela cheia de intrigas, misoginia e, claro, abutres em voos rasantes. A imprensa tradicional, que nunca perde a chance de dramatizar, pintou a internação de Lula como o prenúncio de um colapso iminente. E, como não podia faltar, fizeram de Janja a vilã central dessa esculhambação. Para eles, a primeira-dama é "a dona do Lula", a megera que afastou a Secom e monopolizou as informações. Os póbi, mal sabem que, no Brasil, a comunicação centralizada é o único remédio para não perder o controle da narrativa.
A mídia independente, que deveria ter um tom mais ponderado, resolveu surfar nessa onda também. Não resistiu. Com sua retórica progressista, engrossa o coro de que a comunicação do governo é caótica — e até é, em parte. O circo midiático ainda encontrou tempo para alimentar rumores de uma suposta crise ministerial na qual especula-se sobre a troca entre Paulo Pimenta e Sidônio Palmeira. Mas o alvo tem uma trajetória torta, discatitam Janja e a comunicação do governo para atingir o espólio de Lula, que para a tristeza de muitos que fizerem o L: segue firme e forte. Aliás, é impressionante como essa mulher consegue unir extremos. Para a imprensa conservadora, é um entrave. Para os críticos de esquerda, é uma autoritária. No fim, todos esquecem que estamos falando de um ser humano que ousou ser parceira ativa e presente na vida do presidente.
Não bastasse isso há também aquela comunicação que não está nos portais, no youtube, nem na TV, mas no equivalente às calçadas onde senhoras sentam para conversar miolo de pote. Mal posso esperar para ouvir aquele sotaque gostoso dizendo que Dr. Kalil é um neolieberal safado ou que o presidente Lula meteu um atestado para não assistir ao aumento da taxa de juros no fim da tarde de hoje. Vou nem mentir que eu acho tudo isso mais saudável do que ter que ler as mais absurdas cobranças sobre a presença da família de Lula na UTI do Sírio Libanês, como se Janja além de roubar o emprego de Paulo Pimenta tivesse roubando o lugar dos filhos de netos do marido, e como se todos os pormenores da convivência entre essa ruma de gente fosse de conhecimento público. Parece que até os budejos mais tóxicos têm seus momentos de pausa. Avalie se surgisse (sempre) oportunamente Eduardo Moreira editando um curso ou mentoria com a empolgação de um pastor neopentecostal, para ensinar como se preparar para ser o substituto de Lula? Ave Maria três vezes!
O problema não é a saúde do presidente virar pauta, ou assuntos correlatos à comunicação do governo serem colocados em discussão. O problema, muito mais grave do que um hematoma intracraniano, é transformar em assunto nacional o que sequer é assunto. Talvez o grande erro de Lula, já que a ordem do dia é fazer esses apontamentos, tenha sido tornar público o que não era necessário. O procedimento, que pode ser feito sem anestesia e numa mesa de consultório, poderia ser mantido sob o mesmo nível de discrição de um exame de urina ou um hemograma; mas foi exposto a pedido do casal. Por isso o improviso do quebra-queixo na porta do hospital. Tudo além disso é budejo.
Enquanto isso, Lula segue se recuperando. Os médicos garantem que ele está bem, mas a mídia insiste em tratá-lo como um moribundo. No epicentro dessa confusão toda, Janja continua sendo Janja: a mulher que não se deixa abater pelos budejos alheios. E nós, aqui do lado de fora, seguimos aprendendo que o Brasil tem muito o que amadurecer. Talvez um dia consigamos lidar com nossas figuras públicas sem transformá-las em espetáculos de arena romana.
Otávio Guedes ou Barbara Gancia? Roda a roleta!
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